sexta-feira, julho 15, 2005
Para acabar de vez com os amigos VI: Stretto
Depois do massacre da noite, o despertar. Quanto tempo demorou a noite escura? perguntas a ti mesmo. Foram dias? Meses? Anos? Perdeste o sentido do tempo. Mas voltaste. E quando voltaste estava tudo destruído. Pensas que é como olhar para terra queimada, que é como olhar para os escombros de uma cidade bombardeada. E depois vêm à tona da memória pequenas imagens, fragmentos de destruição e violência. E é então que começas a perceber. Primeiro, lentamente, depois, com uma clareza brutal. É então que percebes que foste tu que bombardeaste o Mundo. Achamos que o sofrimento nos faz mais sábios e mais fortes mas não é verdade, estamos apenas mais fracos e mais pobres. E depois existem os Outros, que simplesmente não sabem o que fazer connosco. Eles tentam dizer qualquer coisa, fazer qualquer coisa, mas o quê? E todos eles estão irremediavelmente distantes. É como olhar pelo lado errado dos binóculos, é como estar dentro de um sonho consciente de que é um sonho. E nenhuma segunda oportunidade te é dada. São com estes que tens de refazer a vida. E sabes que é impossível, que está tudo irremediavelmente partido. E o que se partiu não pode ser concertado. E não sentes nada. És nada. Estou morto, dizes a ti mesmo, isto é o mesmo que estar morto. Dizes a ti mesmo que ter sobrevivido é suficiente, que tem de ser suficiente quando já nada o é. Porque sabes que vais morrer pelo menos ainda mais uma vez. Apenas e ainda.
Banda Sonora: Pigeonhed — The Full Sentence.